Sobre o Perdão
Enquanto acharmos que existe algo ou alguém a ser perdoado,
não perdoaremos nada nem ninguém, nem total nem parcialmente. O perdão parcial
não existe, é só mais uma cômoda invenção.
Sem que exista uma mudança radical do ponto de vista da
história, o perdão não é possível.
Enquanto não nos desprendermos de idéias e frases
padronizadas – "Ele me fez isso!", "Ela me fez aquilo!",
"Ah, se fosse comigo!", “Ele me fez isso, mas eu perdoei!”, "Ele
lhe fez tudo isso e você não fez nada?" –, não estaremos habilitados a
perdoar. Estaremos ainda muito presos ao Eu, estaremos reféns das idéias, das
histórias.
Conflitos e mágoas acontecem porque fantasiamos, exageramos,
criamos ilusões, expectativas, sobre situações que nos acontecem ou sobre o
futuro, porque culpamos os outros por não terem realizado nossos desejos,
nossas fantasias, por não terem correspondido às nossas expectativas. Mas,
quando conseguimos enxergar o quadro sob um outro ponto de vista, percebemos
que nada havia a ser perdoado, nós é que estávamos delirando, sonhando,
fantasiando, distorcendo as coisas.
Enquanto adotarmos a postura de alardearmos nosso perdão às
pessoas, a despeito de elas nos terem feito isso ou aquilo, não estamos
perdoando de fato. Estamos, sim, nos enganando, fechando as portas para um
perdão real, carregando mágoas, raivas e ressentimentos, que se estenderão por
muito tempo. No fundo, o próprio enunciado de nossos dizeres, revela que não
perdoamos.
Enquanto não aceitarmos as coisas, as pessoas, as situações
como realmente são, a vida tal qual se apresenta, não será possível perdão
algum. Precisamos entender que tudo é como deveria ser. Nós é que, com nosso
orgulho, achamos que tudo deveria ser diferente, que tudo deveria ser do jeito
que idealizamos.
Não perdoamos porque somos impacientes, intolerantes; porque
nos colocamos como vítimas das situações; porque não aceitamos os outros ou as
situações. Não aceitamos pessoas e fatos e queremos ser aceitos. Não perdoamos
e queremos ser perdoados. Não respeitamos e queremos ser respeitados. Somos
incapazes de parar para perceber que tudo isso é conseqüência direta do fato de
não nos aceitarmos, de não nos respeitarmos, de não nos perdoarmos, de vivermos
nos culpando, nos cobrando.
Egoístas que somos, acreditamos que precisamos perdoar o
próximo e esquecemos que também precisamos de seu perdão. Talvez, saindo um
pouco de dentro de nós mesmos e sendo um pouco menos egoístas, possamos
alcançar a percepção de que também precisamos ser perdoados. Certamente, já
erramos muito e continuamos a errar, a magoar pessoas próximas sem perceber, a
agir mal, a irritar os outros. Certamente, por muitas vezes, também já causamos
sofrimento a terceiros. Não somos tão santos quanto acreditamos ser. Esta nova
percepção, uma vez atingida, nos levará a relaxar. E, assim, poderemos ampliar
significativamente nossa capacidade de perdão, pois teremos compreendido que os
outros também precisam nos perdoar, e muito.
A esse respeito, reflitamos sobre as sábias palavras do
Cristo, em Mateus 18:
21 – Então, Pedro, chegando–se a ele, disse: Senhor, até
quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete?
22 – Jesus lhe disse: Não te digo que até sete, mas até
setenta vezes sete.
23 – Por isso, o Reino dos céus pode comparar–se a um certo
rei que quis fazer contas com os seus servos;
24 – e, começando a fazer contas, foi–lhe apresentado um que
lhe devia dez mil talentos.
25 – E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que
ele, e sua mulher, e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para
que a [dívida] se lhe pagasse.
26 – Então, aquele servo, prostrando–se, o reverenciava,
dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei.
27 – Então, o senhor daquele servo, movido de íntima
compaixão, soltou–o e perdoou–lhe a dívida.
28 – Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus
conservos que lhe devia cem dinheiros e, lançando mão dele, sufocava–o,
dizendo: Paga–me o que me deves.
29 – Então, o seu companheiro, prostrando–se a seus pés,
rogava–lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei.
30 – Ele, porém, não quis; antes, foi encerrá–lo na prisão,
até que pagasse a dívida.
31 – Vendo, pois, os seus conservos o que acontecia,
contristaram–se muito e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara.
32 – Então, o seu senhor, chamando–o à sua presença,
disse–lhe: Servo malvado, perdoei–te toda aquela dívida, porque me suplicaste.
33 – Não devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro,
como eu também tive misericórdia de ti?
34 – E, indignado, o seu senhor o entregou aos
atormentadores, até que pagasse tudo o que devia.
35 – Assim vos fará também meu pai celestial, se do coração
não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas.
Para sabermos quantas vezes, pelo quê e quando devemos
perdoar alguém, basta perguntarmo-nos quantas vezes, pelo quê e quando
gostaríamos de ser perdoados.
Buscar o perdão é buscar compreender o outro, compreender as
situações; é buscar um novo ponto de vista, um ponto de vista mais altruísta; é
renunciar aos nossos próprios sofrimentos, praticar a tolerância, a paciência,
a compaixão, a sensibilidade. Todas esses atos, por si, já são atos de perdão.
POR: FABIO FERREIRA BALOTA
Agradecemos a inclusão
deste blog em seu compartilhamento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário